segunda-feira, 24 de maio de 2010

Sobre as Helenas e Benés da Globo e do Brasil...




Por Maria José Cotrim

Quantos atores negros atuaram na novela “Viver a Vida”? Tá bom vou facilitar: “Quantos protagonistas teve a novela que findou semana passada?” Última tentativa: “Qual foi a representatividade negra no horário nobre no elenco da novela Viver a Vida de Manuel Carlos?

Sem mais rodeios: foi negativa! Estou convencida disso com certeza. A impressão que tenho é que alguma coisa deu errado desde o início da novela e impediu que, pelo menos para mim, a participação dos atores negros fosse mais forte. A Helena de Manoel Carlos, Taís Araújo, foi alvo de muitos críticos da Televisão pela sua atuação. Cheguei a ver uma revista que tinha na capa: “Público pede a morte de Helena”.

Causou espanto ver a atuação da Taís: o que não casou foi o enredo que ela foi inserida. Sim! Quem não se lembra que as tradicionais Helenas do Maneco tinham em comum a personalidade forte, o espírito de liderança. Com a Taís não foi assim! Basta lembrar a cena que a Helena se ajoelhou para pedir perdão à Teresa, personagem de Lília Cabral, e foi agredida por ela.

Colocaram a Helena como “A MODELO Nº 1”da trama. Mas...alguém viu outras modelos negras nos desfiles da novela? Outros ícones da beleza negra nas passarelas? Em tempos que adotam “cotas nas passarelas” o espaço seria ideal para a discussão. A essência da personagem dividiu opiniões e seu protagonismo foi automaticamente “roubado” pela personagem de Aline Morais, a Luciana, que fez bonito na Telinha mostrando de forma profissional o dilema dos portadores de deficiência física.

Saindo da Taís e passando para o Bené, o namorado/marido complicado da irmã de Helena, a Sandrinha. Ele, da favela, enrolado nas entranhas sociais de quem vive/sobrevive nas favelas brasileiras entre a vida e a morte mas que demonstrou vontade de mudar. A mulher, o filho...a felicidade familiar que ele nem sabia que existia levou o Bené a mudar.

Na realidade isso não é diferente. Quantos Benés não mudam todos os dias? Mas não, na trama o fim dele foi morto com mais de três tiros. Assisti a cena enquanto comia um lanche. Coisa brutal! A morte do Bené mostrou uma abordagem negativa por parte do autor e talvez tenha sido a intenção. Não vou aqui travar debate sobre enredos de novelas mas arrisco dizer que o significado do personagem poderia sim ir mais além.

Na favela é assim mesmo: sobrevida! Mas na novela tudo poderia ter sido diferente. No mundo real existem cada vez mais Benés que descobrem que o mundo do crime vem acabando com as famílias e resolver sair dessa esfera. E essa superação precisa ser mostrada. Ninguém pode dizer que a Globo não aumentou a representatividade dos atores negros mas ninguém pode também dizer que a abordagem ainda não deixa a desejar.

Por trás de uma simples novela e personagens existe uma estratégia de comunicação. Porque não é só lendo livros que adquirimos conceitos, é ao consumir produtos midiáticos como as novelas que formamos muito conceitos e refletimos sobre questões sociais, mas é claro que depende dos detentores da “comunicação” escolher como usar este “instrumento de poder” como diz Muniz Sodré. Ainda precisamos com certeza de uma abertura mais coerente e satisfatória nos meios de comunicação. E não é só falar, dar espaço é de abordagem qualitativa que estou falando!

Concordo com o publicitário e diretor executivo do Instituto Mídia Étnica, Paulo Rogério que chama a atenção para a descolonização dos meios de comunicação para resgatar conceitos e valores presentes na cultura negra. Ele diz que as reflexões sobre racismo devem necessariamente pautar a concepção de TV pública no país. Mas quem decide são os “caras lá de cima”, os tais detentores do poder comunicacional. Aos telespectadores cabe rir, chorar ou trocar o canal!

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