domingo, 21 de junho de 2009

MOVIMENTO NEGRO DE ROTAÇÃO...



Maria José Cotrim

Neste sábado estava na estação de ônibus quando ouvi duas senhoras conversando. Uma delas criticava bem alto um pastor de uma igreja. A outra, num tom mais baixo concordava e também descia a língua na atuação da igreja em questão. “Irmã fulana tem dois anos que freqüenta e até agora ainda mora de aluguel, o marido ainda desempregado, quem é que garante que o que agente dá pra essas igrejas volta pra gente?”, resmungava a senhora.

A outra, olhando por debaixo dos óculos também não poupou críticas. “É agente tira de onde não tem para dar pra igreja, os pastores enricam e agente fica chupando dedo”, disse. Foi inevitável não mergulhar em pensamentos depois que ouvi a conversa. Comecei a pensar sobre a participação social de cada um como cidadão crítico e ativo na sociedade e principalmente nos espaços de poder.Até que ponto fazemos nossa parte para mobilizar ou provocar a mudança?

Vou mais adiante e levo essa discussão para o Movimento negro. Acredito na atuação de um movimento consolidado buscando um diálogo com o poder público e empenhado em identificar e lutar pelas demandas. Como essa relação será estabelecida?depende da situação e da reivindicação em questão, vale tudo para exigir nossos direitos! No nosso país existem grandes líderes empenhados e que dão o sangue na luta pela igualdade racial, a exemplo do grande pai da luta, Zumbi!Gente mobilizada, atenta e cheia de atitude que bota a boca no trombone para dizer não ao preconceito, graças a eles enxergamos hoje grandes conquistas de inclusão.

Mas existe também o outro lado da moeda.O que chamo de movimento de rotação, que como o planeta terra, gira em torno de si mesmo.Infelizmente vejo pessoas que constituem o movimento para engrandecer líderes e partidos políticos.Gente que precisa de militantes e aliados apenas para fazer volume, preencher fichas de filiados e levantar a bandeira. Ora, não devemos dar as mãos para incentivarmos as políticas públicas? Pelo menos esse é o discurso!

A mídia é um dos grandes vilões contra o movimento negro. Vários veículos descaracterizam a luta contra a discriminação racial e com um discurso pobre argumenta que “o movimento divide a sociedade e coloca o negro excluído da sociedade”. Essa é uma brecha que o movimento de rotação dá para esta abordagem pois trabalha o negro como um sujeito isolado da sociedade!Ele olha para o próprio umbigo e não dialoga, o que faz a luta girar e beneficiar poucos.

O negro em debate é a prova de que devemos discutir e falar do negro de uma forma diferente, é só abrir espaço para isso. O movimento tem que crescer sim e reinvindicar muito, porque o preconceito não para...se renova a cada dia e vem se manifestando de formas variadas a cada dia.A mídia coloca o movimento como uma forma de reafirmar o preconceito. Por isso, vamos dar as mãos pela causa. Por mais oportunidade, por políticas de curto, médio e longo prazo, pela igualdade racial...
Não façamos como as senhoras do ônibus que sem fazer sua parte, preferem ficar no sedentarismo criticando. Temos ainda um longo caminho pela frente, companheiros!Antes das promoções pessoais está aí uma dívida social com mais da metade da população brasileira.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Não ao diploma: Censura escancarada ao Jornalismo!


Manifestação do Sindicato dos Jornalistas do Tocantins

Maria José Cotrim*


Indignada! È assim que me sinto com a decisão do Supremo Tribunal Federal que extingiu o diploma para o exercício da profissão de jornalista. Por oito a um vi, uma profissão tão polêmica ser reduzida por causa da “liberdade de expressão”. Para mim, neste país quando não se tem argumento: apela-se para a liberdade de expressão!

Ouvi ministros dizerem que Jornalista não oferece perigo para a sociedade. Pergunte então á alguém que teve sua imagem destruída por um veículo sensacionalista, ou um cidadão que perdeu uma prova de concurso por um horário divulgado errado na mídia!

Como dizer não ao diploma?Para mim, ele continua tendo o mesmo valor. E, não conformada com a graduação busco ainda a pós e mestrado. Porque é um absurdo ignorar que a sala de aula pode sim formar bons profissionais.Imagino eu que não esperavam que fizéssemos voto de silêncio diante desta possibilidade sem fundamento. Justo nós, os curiosos de plantão!

O diploma representa mais que um papel com uma declaração e algumas assinaturas, o valor agregado á ele traduz toda uma experiência acadêmica, um aproveitamento didático e principalmente o esforço e dedicação que durante quatro anos ou mais faz parte de nossa vida.

Saindo da parte melódica e sendo mais argumentativa: O diploma representa que somos cidadãos mais bem formados criticamente para prestar um serviço de qualidade á altura do que a sociedade precisa. È um símbolo que agregado á competência de cada um faz sim a diferença.

Desde o primeiro semestre da faculdade somos apresentados ao casal: teoria e prática. Toda profissão precisa da harmonia deste casamento para desempenhar sua função social. Além disso, o diploma não é um troféu, pode até ser exibido, mas não atesta competência, esta se constrói!

Conheço muitos colegas que depois de anos de profissão concluem de fato o curso e outros que ainda nem começaram. Dizer sim ao diploma é estimular estes profissionais á entrarem no curso e buscar o aperfeiçoamento. Eles, na sala de aula, contribuem de forma positiva e somam muito nas discussões e no ambiente acadêmico, pois compartilham as experiências das redações. Afinal, o aprender é uma atividade constante e todos, não importa profissão ou idade, estão nesse processo.

Grandes jornalistas fizeram história e nem precisaram de diploma para isso. È o caso de minha ex-colega e grande amiga, jornalista Roberta Tum que pela dedicação total à atividade jornalística concluiu o curso depois de 20 anos de profissão. A trajetória de sucesso veio mesmo sem diploma!

Quanto ao argumento de que o diploma tira a liberdade de expressão das pessoas? Que nada! Eles sabem bem o que realmente tira essa tal liberdade: a censura! aquela do período da ditadura e que ainda vive entre nós. Dizer não ao diploma é renunciar o esforço do governo federal para garantir o ensino superior aos jovens brasileiros.

È derrubar os sonhos de muitos jovens que sonham com a profissão e que querem e precisam passar pela universidade para estarem prontos. Esquecer o diploma é reconhecer que o Brasil ainda precisa avançar muito em políticas públicas na Educação. È ignorar a importância das teorias da comunicação, de aprender sobre gestão da comunicação integrada, de conhecer a história da imprensa no Brasil, de aperfeiçoar seus conhecimentos na área.

Não precisar de diploma é deixar a área da comunicação sem pesquisas científicas. Deixar o jornalismo sem um legado científico. Sim, porque é na busca pelo diploma que desenvolvemos pesquisas na área e neste processo, conhecemos autores e escrevemos melhor.

Dizer tchau ao canudo é dizer que não precisamos dos profissionais de docência do ensino superior, nossos professores que se dedicam exclusivamente á atividade acadêmica. Que se atualizam todos os dias para nos propiciar mais e mais conhecimento.

A aprovação do Recurso Extraordinário (RE) nº 511961, que questiona a constitucionalidade da exigência do diploma em Jornalismo como requisito para o exercício da profissão é uma grande prova de que o Brasil, assim como no período militar, continua com as formas de censura contra o Jornalismo. Mas não me deixa menos animada, pois o aprendizado é sim a chave para o conhecimento.

Exigir o diploma é dar mais segurança para a sociedade. Fazer com que esta se orgulhe dos profissionais da comunicação, com que admirem e valorizem mais nosso trabalho. E assim, espera-se que profissionais formados e diplomados levem notícias com mais responsabilidade. Eu acredito nisso e 75% da sociedade brasileira também. Pena que os ministros não levaram isso em conta.

Maria José Cotrim é jornalista e articulista do Negro em Debate

terça-feira, 16 de junho de 2009

Palmas Fashion White?!



Maria José Cotrim*

Palmas vai virar capital da moda por três dias. Esse é o lema do que dizem ser o maior evento da moda do Tocantins: o Palmas Fashion Week! Lançado experimentalmente em setembro do ano passado, o evento organizado por um grupo de proprietários de lojas de Palmas já teve sua segunda edição anunciada: será de 17 a 20 de junho no Espaço Cultural.

Os estilistas tocantinenses na luta e no propósito de proporcionar um pouco das tendências das passarelas para os palmenses. Cores variadas, a moda da época, combinações e é claro o que há de mais novo no mercado. É com certeza uma oportunidade de gerar negócios e familiarizar o palmense com este fantástico e versátil mundo da moda.

Que o evento dá visibilidade para o Tocantins no cenário nacional da moda, todos sabemos. Que é preciso juntar forças e esforços para consolidar e viabilizar o PFW no Estado, não há dúvidas. O retorno financeiro para as grifes e lojas, já que Palmas já tem uma classe média definida e é claro exigente dentro dos padrões da moda, é garantido. Mas quando faço essa análise me lembro de uma questão recentemente abordada nas passarelas: as cotas para modelos negros!

Num momento em que a organização do maior evento de moda do Brasil, o São Paulo Fashion Week terá que reservar vagas para modelos negras é pertinente questionar se nas passarelas de Palmas a beleza negra será retratada. Num município em que segundo último censo do IBGE, cerca de mais de 50% da população é negra e estando ainda morna a discussão em torno disso entre fashionistas e estilistas, será que já na segunda edição o processo de seleção contemplou a participação de modelos negros?

A dúvida é pertinente e não quer calar. Os críticos de plantão que sustentam que as cotas podem atingir negativamente a autoestima dos modelos não levaram em conta que a representatividade do negro nas passarelas traz um conjunto de valores agregados. A criança que está no processo de construção de sua identidade étnica, por exemplo, terá com certeza uma autofirmação de sua identidade, além de quebrar o padrão eurocêntrico das passarelas.

A mais nova capital, como todos os cantos deste país, tem forte presença e variadas formas de beleza negra, e o Palmas Fashion Week tem que refletir este aspecto nas passarelas.A moda não vê os negros como consumidores e não se preocupa em incluir afrodescendente nas tendências. A galinha começa a encher o bico de grão em grão e a inclusão do negro na sociedade de classe deve começar desde os bancos escolares repassando ás nossas crianças o respeito ás diferenças, passando pelas passarelas e espaços de poder.Não adianta tratar os desiguais como iguais, a dívida tem que começar a ser paga em todos os setores.Políticas afirmativas e de reparação social!

*Maria José Cotrim é Jornalista e articulista do Negro em Debate

segunda-feira, 15 de junho de 2009

APINÉIA DO SONO: 30% DA POPULAÇÃO É ATINGIDA PELA DOENÇA



Hoje em dia somos atingidos por uma série de sintomas que se confundem e atrapalham o diagnóstico de algumas doenças. Hoje vamos falar sobre Apinéia do sono, uma doença que atinge cerca de 30% da população. Além de causar os incômodos roncos noturnos, acompanhados de paradas momentâneas da respiração, essa condição está ligada a uma maior incidência de problemas cardiovasculares.

Em casos mais graves, a apneia é tratada com aparelhos portáteis (CPAP), que se acoplam ao rosto por meio de máscara usada durante o sono. Em grau moderado e leve, contudo, o problema persiste como um desafio para os médicos.A eficiência dos atuais métodos - aparelhos portáteis, perda de peso, cirurgia e aparelhos intra-orais - varia muito em função do perfil do paciente.

Pessoas que sofrem de apneia costumam ter a qualidade de seu sono comprometida pelas interrupções na oxigenação dos pulmões. Isso acarreta não somente sonolência continuada ao longo do dia, mas a ativação de uma cascata de mudanças no metabolismo que aceleram o processo de aterosclerose nas artérias do corpo.É bastante comum a doença estar associada a outras patologias correlacionadas a doenças do coração e dos vasos do corpo, como obesidade, hipertensão e diabetes.

Novo tratamento

Uma equipe do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) desenvolveu uma série de exercícios de fonoaudiologia para fortalecer os músculos da garganta e tratar a apnéia do sono.
O método consiste numa série de exercícios direcionados para o fortalecimento da musculatura da língua e garganta (palato superior). Isso porque, na apneia do sono, esses músculos relaxam além do devido, provocando o colapso da musculatura. O estreitamento da garganta decorrente desse processo resulta em paradas transitórias da respiração.

O Estudo

Um grupo de 31 pacientes participou do estudo do Incor - todos com diagnóstico de apneia do sono de grau moderado e leve. Um subgrupo de 16 pessoas foi sorteado para praticar os exercícios, com séries diárias de 30 minutos. Ao final de três meses, o subgrupo que foi submetido à nova técnica apresentou melhora significativa nos indicadores de apneia.

Mudanças de hábitos

Pessoas com apnéia do sono devem algumas mudanças de hábitos, como:
* Evitar o consumo de álcool, fumo, e remédios para dormir.
* Emagrecer caso esteja acima do peso.
* Dormir de lado ao invés de bruços.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Comunidade Quilombola do Tocantins dá exemplo de autosustentabilidade



A Comunidade Quilombola de Lagoa da Pedra desenvolve desde 2006, o modelo de produção Mandala, um tipo de horta em sistema circular. A iniciativa proporcionou à comunidade a autosustentabilidade, um dos temas que serão abordados durante o Seminário Internacional ‘Crise Civilizacional: Distintos olhares’, que será realizado no Tocantins, no período de 22 a 24 de junho.
Lagoa da Pedra está localizada a 35 km do município de Arraias, na região Sudeste do Tocantins, é formada por 35 famílias, e lá residem, aproximadamente, 200 pessoas remanescentes de quilombos, que vivem da agricultura familiar de subsistência, numa área de 80 alqueires.

Segundo o presidente da Associação de Moradores da Comunidade, Ruimar Antônio de Farias, o sistema Mandala, contribuiu para a melhoria da qualidade de vida dos moradores. “Antigamente a gente quase não comia frutas e legumes, porque para termos acesso, a esses tipos de alimentos, era preciso nos deslocar para comprar na cidade de Arraias. Agora, colhemos as frutas e legumes na hora e isso garante uma melhor qualidade na alimentação da nossa gente, sem contar que tudo é orgânico”, afirmou.

Para a presidente da horta comunitária, Rosana Antônio de Farias, após a implantação do sistema Mandala tudo mudou. “Antes, muitas pessoas nem conheciam algumas hortaliças como rúcula e rabanete. Hoje, quando a produção está pequena, os moradores começam a se preocupar com a próxima plantação. Outro ponto que mudou visivelmente foi à saúde e o rendimento dos alunos na escola”, disse Rosana, que também é professora na Comunidade.

Segundo o diretor de planejamento de desenvolvimento regional e municipal, da Secretaria de Planejamento do Tocantins (Seplan), Raimundo Nonato Casé de Brito, a idéia de se montar o Projeto Mandala em Lagoa da Pedra, surgiu depois que técnicos da Seplan verificaram que a comunidade possuía grande potencial para trabalhar em equipe.

“Para que tudo acontecesse trabalhamos em conjunto com o Ruraltins – Instituto de Desenvolvimento Rural do Estado do Tocantins, que desenvolveu a parte institucional e ministrou diversos cursos como o de agroecologia para 40 pessoas”, concluiu Nonato.

Conforme informações obtidas no Ruraltins de Arraias, o Governo do Estado ao implantar a horta, no modelo Mandala, em Lagoa da Pedra, também se preocupou com o meio ambiente e com a saúde dos moradores, daquele lugar.

“Foi desenvolvido um projeto piloto de agroecologia no local, todos os produtos da horta são orgânicos, com isso, os moradores obtém produtos saudáveis e não poluem o meio ambiente. Para que isso fosse possível os moradores aprenderam, por meio de cursos, a produzir inseticidas não poluentes e a manejar a produção sem contaminar e destruir o ambiente”, relatou o técnico do Ruraltins, de Arraias, Antônio Conceição Francisco de Oliveira.

Projeto Mandala

O projeto é um sistema de irrigação de baixo custo, que facilita a produção de alimentos de subsistência. É uma experiência desenvolvida inicialmente, pelo Sebrae da Paraíba. A horta é formada por canteiros circulares destinados ao plantio de hortaliças, como cenoura, beterraba, milho, tomate e folhagens. O centro é composto por um reservatório de água para criação de peixe e pato.

Seminário Internacional

O tema sustentabilidade será abordado durante o “Seminário Internacional Crise civilizacional: Distintos Olhares”, que será realizado em Palmas, capital do Tocantins, de 22 a 24 de junho. O assessor da Presidência da Agência das Águas, Hamilton Pereira, coordenará a mesa-redonda, no dia 24, às 8h30, durante a abordagem do Tema “Economia e sustentabilidade: quais Alternativas?”.

A mesa-redonda contará com a participação da presidente da ECOeco, professora da UFPA, Maria Amélia Enriquez; do professor do CDS./UnB, João Nildo Vianna; do representante do Instituto de Telecomunicações (França) Jean Marc Salmon e do representante da Universidade das Nações Unidas, Marcos Antônio Dias.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

"Negros em novelas ainda são poucos", diz Milton Gonçalves



Na entrevista a seguir, o ator fala sobre racismo e política – meio no qual já atuou e que não pretende voltar. E ainda sai em defesa do seu recente e polêmico personagem. “As contradições do Romildo são muito próximas das do resto da humanidade”.

O deputado Romildo Rosa é inspirado em algum político?

Milton Gonçalves – Minha formação é teatral, considero o Stanislavski [Constantin Stanislavski, ator russo, criador do método de atuação realista, ainda hoje básico na arte dramática] meu grande mestre. Nós, atores, demoramos a aprender que interpretar é fácil. Quando vou fazer um papel, uso tudo que tenho dentro de mim, meu universo secreto. Todo ser humano tem sua reserva de maldade, de horror, seu lado obscuro, que é o que alimenta esses políticos corruptos. Empresto ao personagem o que tenho de ruim. Mas considero o Romildo antes de tudo um pai amoroso e lutador, mesmo com seus sérios desvios de caráter.

Mostrar o lado humano de um político corrupto em uma novela não é uma aposta arriscada?
Gonçalves – As contradições do Romildo são muito próximas das do resto da humanidade. Quantas pessoas não cairiam em tentação diante de um suborno? Ainda mais nesse mundo em crise.

Você acha que ninguém é incorruptível?

Gonçalves – Seria audácia dizer isso. Graças a Deus recebo um bom salário, vivo num céu. Mas vim de família pobre e já vivi situações em que fui tentado a me corromper, a usufruir de benefícios que não me cabiam. E decidi que aquele não era o meu caminho.

Foi durante seu envolvimento com a política [Gonçalves foi candidato ao governo do Rio e atuou como subsecretário do Gabinete Civil na gestão do governador Marcello Alencar, em 1994]?

Gonçalves – Pode investigar e você vai ver que nunca houve desvio de conduta da minha parte. Sou um herói por isso? Não, não sou. Apenas não sou como essa gente que tem por aí.

Você pensa em voltar para a política? Acha que o fato de interpretar um deputado corrupto poderia te prejudicar junto ao eleitorado?
Gonçalves – Sou membro do diretório estadual do PMDB carioca, mas não penso em me candidatar novamente -pela minha idade e pelo bem da minha saúde. Há um carinho muito grande das pessoas que sempre acompanharam meu trabalho, apesar de alguns fãs estarem me chamando de corrupto nas ruas.

Você defende o Romildo?


Gonçalves –
O Romildo, com toda sua demagogia, é um personagem vivo. Em todas as tragédias gregas e na literatura há personagens com desvios de caráter. Quem muda a cara do mundo são os vilões, são os atos de vilania que acordam a massa. Para mim, Romildo é tão clássico quanto Hamlet. E se você observar os quase 40 personagens de ‘A favorita’ verá que todos têm algum desvio ético.

Nos folhetins do passado os personagens eram mais maniqueístas: ou eram "do bem" ou "do mal"...

Gonçalves – Hoje é possível ousar mais, o público não é mais tão ingênuo. As cenas são mais lascivas, é língua pra lá, é gemido para cá... Você acredita que às 21h30 não tem criança vendo televisão? Mas acho que a vida real é muito mais dura e chocante que as cenas de novela.

Você sempre foi um militante da causa negra e lutou por mais espaço para os negros na TV. Sofreu muito preconceito no início da carreira?

Gonçalves – Tive sorte de começar no Teatro de Arena e lá ninguém queria saber se eu era negro, gordo ou baixo. Nossa preocupação era mostrar o país, o brasileiro médio: o mestiço, filho de negro, branco, índio, oriental... Já na TV as coisas foram mais difíceis. Interpretei muitos papéis considerados clichês para um ator negro. Até que um dia cheguei no Dias Gomes e pedi um personagem que usasse terno, gravata e falasse um português correto. E foi pelas mãos da Janete Clair que vivi um psiquiatra, o doutor Percival [na novela “Pecado capital”, de 1975].

E como esse personagem foi recebido na época?
Gonçalves – A polêmica foi maior em “Baila comigo” [de Manoel Carlos, exibida em 1981]. Meu personagem, o Otto, era casado com o da atriz Beatriz Lyra, e você não imagina o que ela sofreu na época, coitada. Foram muitas críticas, do público e até dentro da própria equipe da novela. Era muito raro uma atriz branca, bonita e conceituada fazer par romântico com um ator negro – mesmo ele também sendo bonito e conceituado.

Você acha que há mais espaço para os negros nas novelas atualmente?

Gonçalves – Infelizmente não. Ainda somos poucos e esse é o grande problema. Nesta novela que estou fazendo há quatro personagens negros: o Romildo, a Alícia, o Didu e a empregada da família Fontini, a Antônia. Isso quer dizer que preconceito acabou? Acabou porque a Taís Araújo aparece na capa das revistas de moda? Não, não acabou. Nós somos exceção. E pensar que o negro é mais da metade da população brasileira...

Você acha que a eleição do Barack Obama vai ajudar a diminuir o preconceito?

Gonçalves –
O Brasil define o negro pela aparência, é diferente dos Estados Unidos, que define pelo sangue. Aqui existe essa coisa de marrom, mulato, pardo... Pardo, para mim, é cor de papel de embrulho! O negro americano não é melhor nem pior que o brasileiro. Mas eles aprenderam a lutar, a reivindicar seus direitos, a parar de se vitimizar e a ter orgulho de sua raça.